Por outro lado, especialistas criticam os separatistas e defendem a nação brasileira integrada
Publicado 17/02/2012 às 10:33:25
- Atualizado em 17/02/2012 às 10:47:27
Movimento luta pela separação do Sul do Brasil, para tornar
os três Estados independente. (Foto: Divulgação)
Antigo, mas ainda causador de debates polêmicos na sociedade
brasileira, o Movimento O Sul é meu País volta a ganhar mais atenção
neste ano em que completa 20 anos de funcionamento oficial. Nos dias 17 e
18 de março, o grupo realiza um congresso em Florianópolis, onde
pretende reunir os cerca de 30 mil filiados e mais os simpatizantes.
Em pauta, o Projeto de Consultas Populares, a ampliação das
organizações nos municípios e ainda a formação do ParlaSul (Parlamento
do Sul). “A idéia é criar a ‘Câmara dos Comuns’ em todos os municípios
do Sul como forma de buscar maior participação dos simpatizantes,
militantes e lideranças separatistas nas decisões que vem sendo tomadas
pelos Executivos e Legislativos”, antecipa o presidente nacional do
movimento, o catarinense Celso Deucher.
Mesmo com o movimento em plena atividade, especialistas sustentam
opiniões contrárias à proposta de separar o Paraná, Santa Catarina e o
Rio Grande do Sul do restante do Brasil. Para o sociólogo de Jaraguá do
Sul Victor Danich, “o Brasil é uma nação integrada culturalmente num
crisol de regionalismos que por si próprios não devem interferir na
cultura predominante, que é justamente aquela que personifica nossa
identidade perante o mundo. Pensar de maneira diferente seria desmerecer
todos aqueles brasileiros que de forma anônima ajudam a construir as
riquezas deste vasto território”.
A socióloga de Joinville Valdete Daufemback Niehues tem o mesmo
entendimento que Danich. “O Brasil é um país que produz muita riqueza.
Sua natureza por si só já soma uma riqueza inestimável, invejável a
outros países, mas também sobra ignorância e falta sabedoria, um
ambiente propício para a proliferação de intenções duvidosas de
oportunistas de plantão”.
Para entender mais sobre o tema e ver os dois lados deste debate,
acompanhe as entrevistas abaixo com o presidente nacional do movimento, o
catarinense Celso Deucher, e com a socióloga Valdete.
Entrevista com a socióloga Valdete Daufemback Niehues:
O Correio do Povo: Qual sua opinião sobre o Movimento o Sul é meu país?
Valdete Daufemback Niehues: Não sou contra nem a
favor, muito pelo contrário, acho uma bobagem, uma brincadeira que
serviu para derrubar muitos mitos do Sul democrático. Mas o movimento
não era o pensamento geral da sociedade, era de algumas pessoas
desprovidas da compreensão de uma visão social macro. Estes movimentos
acontecem geralmente em tempos de crises ou de supostas crises. Os
princípios são os mesmos de seitas religiosas que profetizam o reino no
meio das incertezas.
OCP: A separação do Sul do país causaria um conflito na sociedade?
VD: A Constituição Brasileira é muito clara neste
sentido, não permite a separação da federação. Portanto, duas
possibilidades serão possíveis para concretizar o separatismo: a) por
meio de um plebiscito, o que implicaria na mudança na Constituição
Federal; b) por meio de um movimento separatista, o que implicaria em
uma guerra civil, ou seja, o confronto entre os separatistas (sociedade
civil) e o Exército (Estado).
OCP: O que pensa do argumento do movimento de que há distribuição desigual dos recursos de Brasília entre os Estados?
VD: A distribuição dos recursos em Brasília passa
muito mais pela competência dos políticos do Sul que se elegem para
representar os Estados. Esta é uma visão fragmentada de nação, de
Estado, uma visão tola e tosca herdada dos colonizadores que esfolavam
os trabalhadores e os excluíam do direito e acesso à terra. Separar o
país com este argumento só revela a ambição e a mesquinhez política de
grupos. Uma reforma política no país daria jeito de acabar com a
distribuição desigual de recursos entre os estados. Isso o Congresso e o
Senado poderiam fazer, inclusive, temos bastante representantes por
lá.
Entrevista com o presidente do movimento nacional, Celso Deucher:
O Correio do Povo: Fale sobre a existência do Movimento Sul é o Meu País.
Celso Deucher: O movimento existe legalmente faz 20
anos em março deste ano. No entanto ele ressurgiu de forma organizada a
partir do lançamento do livro “A Independência do Sul” (Martins Livreiro
Editor, Porto Alegre, 1986), de autoria do advogado e sociólogo
riograndense Sérgio Alves de Oliveira.
OCP: Por que ressurgiu?
CD: A palavra ressurgir é usada porque o movimento
já existe há mais de 270 anos. Nasceu a partir das guerras guaraníticas
com a tentativa de fundar aqui no Sul da América Portuguesa uma
República. Morto em 7 de fevereiro de 1756, Sepé Tiarajú lutou pela
independência do território do Sul do Brasil – chamando a atenção das
duas principais potências da época, Espanha e Portugal. Assim, nasceu no
espírito e na alma do povo do Sul o desejo de liberdade.
OCP: O que justifica a luta pela separação do Sul do Brasil?
CD: Há diversas razões para lutarmos pela nossa
libertação do colonialismo de Brasília. Ao longo do tempo foram
enumeradas as principais razões em documentos oficiais. São fatores
políticos, tributários, sociais e históricos...
Políticos: O franco desrespeito à regra constitucional de que “todos
são iguais perante a lei”, além de que a cada eleitor deve corresponder
um voto, permite que a representação na Câmara Federal seja viciada. Uma
perniciosa representação parlamentar gritantemente sem proporção,
quebra também o preceito estabelecido na Constituição sobre a igualdade
entre os Estados Federados. A existência de uma política financeira que
premia a especulação em detrimento da produção. O terrorismo tributário,
que penaliza a cadeia produtiva e de consumo, jogando as livres
iniciativas na marginalidade e promovendo o desemprego. A atual ausência
de autonomia legislativa que deveria ser conferida às Assembléias dos
Estados, que permita legislar sobre matéria cultural, sanitária, penal,
tributária e outras. O descaso com que o Sul tem sido distinguido
permanentemente, relegado sempre a um segundo plano, tendo seus projetos
e anseios sempre adiados indefinidamente.
Tributários: A abominável sangria tributária da região Sul, sempre
submetida à má distribuição do bolo tributário, que privilegia regiões,
discriminando outras, bem como a má distribuição do nosso esforço
tributário que apenas contempla o fortalecimento das oligarquias
políticas clientelistas do Norte e Nordeste, em prejuízo das próprias
populações daquelas regiões. A permanente discriminação orçamentária,
que relega a Região Sul à quase inexistência de investimentos federais.
Sociais: O galopante crescimento da pobreza da população do Sul e a
acentuada degradação social, com a proliferação das condições
sub-humanas, são fatores que causam indignação, principalmente porque
não existe perspectiva de reversão deste caótico quadro dentro do
cenário sob o controle do estado brasileiro.
Históricos: Por fatores semelhantes aos atuais, nossos ancestrais já
empunharam a bandeira da Independência e da Autonomia. A República
Juliana e a República Rio-Grandense são testemunhas seculares de que não
estamos fazendo nada de novo, apenas dando vazão ao centenário ideal de
autodeterminação que vem sendo cultivado pelo nosso povo (...).
OCP: Qual a sua opinião sobre as críticas contrárias ao movimento lançadas por especialistas?
CD: O mundo ao contrário do que estes mesmos
especialistas vivem falando era para estar se unindo e o que vemos é
justamente o contrário, o mundo está cada vez mais se separando em
pequenos Estados. São mais de 450 movimentos separatistas pelo mundo e a
cada ano nascem três novos países. Ao contrário do que estes
desinformados dizem nenhum país deixou de existir até hoje, a não ser a
Alemanha oriental, separada a força pelos vencedores da segunda guerra.
OCP: O senhor tem exemplos atuais?
CD: O caso do Sudão do Sul, e talvez vejamos a
separação da Escócia ainda neste ano. Portanto, os analistas estão na
contramão dos fatos e tentam justificar suas teses em teorias abjetas e
ideológicas descoladas da realidade.
OCP: E os conflitos armados?
CD: É outro engodo ardilosamente disseminado por
gente muito mal intencionada no Brasil. Na verdade não há nada que possa
gerar uma guerra, pois nosso movimento é pacífico e plebiscitário.
OCP: Tornado o Sul um país, como seria então o sistema governamental?
CD: O movimento não discute tais coisas. Nosso
objetivo com esta instituição é debater com nossa população a vontade de
buscarmos nossa total autodeterminação. No entanto o Gesul (Grupo de
Estudos Sul Livre) vem discutindo tais questões e aprofundando-se em
alguns temas, tendo chegado a algumas conclusões, que resumidamente
podemos afirmar que o será um país social-capitalista com livre mercado e
certamente uma das maiores democracias mundiais. Em 2015, o gesul
divulgará as propostas para o novo país.
OCP: Em 2011, o Gesul realizou novas pesquisas sobre a aceitação do movimento. Comete os resultados.
CD: O Gesul vem realizando pesquisas de opinião
desde sua fundação em 2000. Em outubro de 2011 concluiu a coleta e
divulgou os resultados. Ao todo, colheram uma amostra composta de 1991
eleitores das três capitais. Dos 1991 entrevistados, 43,50% aprovariam a
criação de um novo país imediatamente, sendo que 35,20% se
posicionariam contra e 21,30% iriam se abster, considerando o índice de
indecisos.
OCP: Fale um pouco sobre o Gesul e suas ações.
CD: O Grupo de Estudos Sul Livre é formado por
intelectuais dedicados ao estudo do fenômeno separatista na América
Portuguesa e em especial do separatismo Sulista. Foi criado no dia 26 de
agosto de 2000 em Brusque, SC, e mantém em seu quadro de membros
historiadores, filósofos, sociólogos, economistas, constitucionalistas,
advogados e outros pesquisadores. Mantém como foco de seus estudos
avançados o direito de autodeterminação dos povos. Seus membros não
necessariamente são da região Sul, pois possuem em seus quadros
intelectuais de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Brasília, entre
outros.
OCP: A intenção do movimento era em 2010 realizar um plebiscito junto com as eleições presidenciais. O que resultou disso?
CD: A estratégia de 2010 foi suplantada pela nossa
falta de estrutura financeira para bancar uma ação de maior envergadura.
O plebiscito, segundo a CF88, precisa passar obrigatoriamente pelo
Congresso Nacional. Mas nós não estamos interessados nesta estratégia,
já que sabemos que jamais os políticos brasileiros deixarão que isso
aconteça. Preferimos usar de nossos próprios meios para chegar ao fim
almejado e por isso lançamos em maio do ano passado o Projeto de
Consultas Populares. Estas pesquisas de opinião já são partes do
Movimento O Sul é o Meu País que se estende até 2015.
OCP: O que é o projeto?
CD: O Projeto de Consultas Populares pretende
levantar dados estatísticos sobre o que pensa o povo do Sul em relação
ao Brasil. Nós temos pesquisas de anos anteriores que sinalizam para uma
situação que se houvesse de fato este plebiscito, em média 75% da
população Sulista votaria pela separação, optando por criar um novo país
composto apenas pelo Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Mas
não adianta ficar falando isto se não tem como provar tal tese. Por
isso, vamos realizar consultas públicas.
OCP: Qual é a programação?
CD: Em 2011 foram consultados apenas os moradores
das capitais, mas a partir deste ano, as pesquisas vão para todas as 48
cidades Sulistas que possuem mais de 100 mil habitantes. Já em 2013 o
projeto vai consultar cerca de 900 municípios onde há representação
formal do movimento. Em 2014 e 2015 não mais faremos pesquisas, mas sim
votação simulada em todos os locais que o Tribunal Regional Eleitoral
possuir urnas.